segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Sou cristã por falta de opção.

Pode ser que Ele queira que eu mude de profissão.
( agora faltando semanas para que eu me forme, isso soa bem incômodo.)
Ou pode ser que Ele queira sim que eu exerça minha profissão, mas em um lugar ou de um jeito totalmente diferente do que eu considero inteligente, sem nenhum prestígio, sem clientes importantes, sem ser do jeito que sempre sonhei.
Pode ser que me peça pra ir morar em Itaperuçu, em Londres, em Londrina, com uma família linda, ou sozinha.

Com certeza Ele gostaria que eu parasse de ser tão egoísta.

Isso significa que nem minha profissão, nem minha família, nem meu corpo ou meus sonhos deverão ter lugar maior na minha vida do que a vida dEle.

Significa que se tem gente passando fome isso é sim problema meu.
Se tenho amigos que estão com problemas ou pensando em se matar isso também é problema meu.


Se os evangélicos na política estão envergonhando o evangelho da justiça de Cristo isso também é problema meu.
Se o Brasil é um país de desigualdade e injustiça isso é problema meu.
Se ninguém mais acredita na família e no amor, se nessa lambança de sincretismo todo mundo acredita em tudo e em mais nada, se estão destruindo o planeta, se há tráfico, violência, prostituição, morte; se em caçador eles não tem banheiro dentro de casa e se os meus vizinhos moraram aqui 12 anos e nunca conversaram comigo, tudo isso também é problema meu.

Ninguém nunca disse que seria fácil.
Quer dizer, algumas igrejas dizem que é fácil, que dá dinheiro, que vai te deixar milionário, que vai te tirar dos problemas.
Mas é mentira, de milionário Jesus não tinha nada, não acredite nisso.
Ele trouxe um padrão altíssimo de justiça e de amor, viveu só para os outros e tinha uma inteligência alucinante.

Você vai participar de uma igreja e vai perceber que é feita de pessoas comuns, que quanto mais se relacionar mais vai ver pecados, mais vai ver como são podres.
Mais vai enxergar os seus próprios podres, mais vai rir da sua insignificância, mais vai chorar pelos outros e por si mesmo, mais vai perceber sua própria fraqueza e a de todos.

E se você realmente levar a sério, vai ser um constante insatisfeito e questionador, vai querer mudar o mundo e vai abrir mão de tudo pra poder estar mais perto dEle.



"Daquela hora em diante, muitos dos seus discípulos voltaram atrás e deixaram de segui-lo.
Jesus perguntou aos Doze: "Vocês também não querem ir?"
Simão Pedro lhe respondeu: Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras de vida Eterna. Nós cremos e sabemos que és o Santo de Deus."
João 6:68


Sim, pode ser (e certamente será) bem difícil.
Mas assim como respondeu Pedro, para quem iremos?
Em outras palavras, sei que a vida cristã não é um mar de rosas, mas se não for pra viver isso vou viver o quê?

As palavras de Jesus são verdadeiras, a eternidade é real, consigo sentir e entender uma série de coisas.
O evangelho me mostra uma lógica de existência que faz todo o sentido e me faz completa, e, quando lembro da Verdade não me resta opção.

Não posso ignorar tudo o que acontece a minha volta e a história da minha vida e da minha família e não viver isso.Não que o cristianismo implique em obrigação, longe disso, é essencialmente livre arbítrio.


Mas digo que não tenho outra opção, porque se não for pra viver isso, não vale a pena viver pra nada.

Posso escolher viver ou não.
Quem escolheria o contrário?

quarta-feira, 5 de maio de 2010

A Festa

[parte quatro.]

Quando viu o primeiro convidado entrar por aquela porta ele sabia que nunca mais iria esquecer. Não era bonito, nem ao menos notável, nem de andar suave como do Mestre, e como podia ser tão diferente dEle, será que eram eles mesmo?


Lançaram todos olhares de dúvida ao Mestre e ao Filho, que responderam com de calma e certeza que trouxe ainda mais agonia ao coração deles, não podem ser esses os convidados, e olhe bem como estão imundos!

Perceberam que o cheiro vinha deles.

Não eram lindos, muito menos notáveis, eram ridículos.
Sujos, alguns de muletas, feios e acho que nojentos. Foram entrando um por um, lentamente e extasiados com as dimensões do Palácio e estavam todos felizes, como felizes, será que não estão vendo que essa Festa é para os convidados que esperamos desde sempre? Deviam chorar humilhados por terem a cara de pau de entrar aqui desse jeito imundo.

O chão foi ficando escuro por onde eles pisavam.

Pela primeira vez na vida ele sentiu vergonha de ter trabalhado no Palácio.
Odiava com todas as forças cada passo que os convidados davam, que carregados de sujeira foram emporcalhando todo o serviço que ele demorou uma vida inteira para ouvir do Mestre " está pronto".


Estavam todos paralizados.
Os convidados não viriam para o evento mais importante de todos.
O Mestre e o Filho pareciam saber disso desde sempre.
Esses que estavam ali eram o retrato do que de mais ínfimo e feio eles conheciam.

Foram entrando.
Todos,
um a um.
O cheiro vinha deles e o barulho insuportável ia sumindo aos poucos.

O Mestre nunca tinha falado sobre aqueles mendigos, e parecia sempre brilhar os olhos quando falava da festa e dos convidados. Mas se sabia que os verdadeiros convidados não viriam e que só viriam esses por que não cancelou a Festa?

Foi por causa desses aqui que o Filho ficou fora todo esse tempo?






O Mestre finalmente dirigiu a palavra a eles,
"Desamarrem suas capas e busquem água em bacias de prata.
Vocês ainda não entenderam."

domingo, 25 de abril de 2010

A Festa.

[ parte três.


Mas tem algo atrapalhando, esse barulho.

Alguém não fez o que devia ter feito!

O sonho parece de repente acabou e todos ficaram a flor da pele porque algo não estava certo.


É esse barulho estranho, e um cheiro ruim.

Pensaram que havia alguma coisa errada na cozinha, ou sei lá,


deve ter alguma coisa errada .

Os convidados estão chegando alguém deve fazer alguma coisa!


Um a um eles começaram a agitar-se, e sabendo que não tinham permissão para mover-se de seus postos começaram a olhar uns para os outros para saber quando o Mestre chegaria para resolver.


Ele sempre resolvia tudo.


O barulho aumentava, e o cheiro ruim também.

O desespero era tamanho, e a agonia do cheiro que ninguém explicava e o barulhinho chato como que de criança chorando tão agonizante que não sabiam se era mesmo de fora ou de dentro deles, com o pânico que se instalava no Palácio.


O Mestre entrou no salão, mais radiante do que nunca, e como que sabendo de tudo e achando tudo normal,

[como normal, será que Ele não percebe que está dando tudo errado? Por que não manda alguém parar com esse barulho insuportável?]

pediu para começar a música.


E os que estavam cuidando dos seus instrumentos no andar superior,

porque o salão tinha muitos andares,

que já estavam ensaiando as músicas desde sempre, começaram a tocar, meio trêmulos porque afinal estava tudo dando errado e é pra tocar mesmo? O Mestre pediu!


O Filho entrou no salão.

Ainda mais bonito do que era no dia em que saiu.

Da mesma cor e andar do Mestre foi caminhando lentamente pelo salão até que parou na frente dEle.


Cada passo que Ele dava parecia pisar na alma deles, e doía tanto que a vontade contida de urrar de dor pelo desespero estava devorando a todos por dentro.


Pelo menos o chão ainda está limpo, pensou, claro que pequeno, diante do tamanho da desgraça, da Festa que iria dar errado.


Os convidados não vem, disse o Filho.

Eu sabia que não viriam. Você também sabia, Filho. Meu coração não aguenta de alegria pela Festa de hoje.

Que bom que você está aqui.


Os dois deram um longo abraço e firmaram o olhar na direção da Entrada.


O cheiro ficava cada vez pior e o som parecia aumentar e quase não se ouvia a orquestra lá em cima.


Eles chegaram, disse o Mestre.


domingo, 18 de abril de 2010

A Festa

[parte dois]

"O dia chegou.

Todos vocês sabem como aguardo pelos convidados.
Dolorosa e ansiosamente.
Gostaria que hoje a noite cada um tomasse sua posição e aguardasse no salão porque, o Mestre embargou as palavras e marejou os olhos quando disse isso,
os convidados estão chegando."

A medida que iam passando pelo salão até os seus postos,
em absoluto e suspenso
silêncio,
ele pensou que valeu a pena o esforço, o chão estava perfeito.



Ele com os outros já haviam passado muito tempo discutindo sobre os convidados.
Será que poderemos olhar suas vestes?
Convidados tão especiais do mestre, devem ser absolutamente bonitos.
Que honra trabalhar pra eles, acho que a Festa vai ser inesquecível.




Mas o dia passou sem nenhuma palavra.
Todos emudecidos com a expectativa, parados, esperavam, cada um no seu lugar.
O sinal soou e quase que ninguém ouviu, porque já tinham passado esse dia em suas mentes tantas vezes que já sabiam de memória tudo o que aconteceria, e, sabendo, soava quase como a repetição de um sonho frequente.

domingo, 11 de abril de 2010

[com o perdão da analogia] A Festa.

[parte um.]


Passara tanto tempo limpando aquele mármore branco que nem se lembrava de não precisar fazê-lo. Era sua função desde que se lembra, cuidar do chão para que ficasse perfeito. O Mestre havia dito que não existia nada mais importante do que aquela comemoração, e o Palácio deveria estar perfeito. Quando perguntado sobre a data, preferia não revelar, mas insistia em dizer que "breve".


Nunca soube dizer sua idade, e ainda não o sabia, e isso também não importa. Aliás, a não veracidade costuma enriquecer as analogias; não presta ficar falando sobre tempo agora.

Veracidade não é a melhor palavra, porque há coisas aqui que mais verdadeiras e reais estou para conhecer.

É analogia porque não serve como referência histórica e talvez até ofenda alguém a forma com que eu empilhei essas histórias todas para contar uma minha, enfim.


O mestre gosta de analogias.


Era nisso que ele pensava enquanto esfregava o borrado no chão até que ficasse branco, o Mestre fala de um jeito às vezes que é meio enigmático.

Mas adorável, fato.


O salão do palácio era enorme, maior do que qualquer um que existe, e diz-se que salão por apenas supor que ele tenha um fim.

Mas era tão enorme que parecia não ter.

Ele nunca achara medíocre sua função, ninguém fazia isso entre eles. Tão somente alegrava-se de participar da Festa e saber que os convidados de quem o Mestre tanto falava um dia pisariam naquele branco, é melhor que fique ainda mais branco, e se sentirão bem recebidos, tomara.


O Filho do Mestre havia saído já a algum tempo, e esperavam sua volta. Comemoraremos sua volta, alguns diziam. A chegada dos convidados, diziam outros e mal posso esperar, exclamava o Mestre de vez em quando quando apressado passava como que pensamentos em voz alta, nem sei se era para alguém ouvir.


Então o dia amanheceu agitado e suspeito, e ele não viu ninguém no caminho até o Palácio e seu coração começou a bater forte, será que chegou o dia?


O Mestre estava esperando no salão com as mãos em cima da vassoura do balde, são minhas coisas o que o Mestre está fazendo aqui?, será que fiz alguma coisa errada? Não sei se devo perguntar, ou agradecer, que honra o Mestre nas minhas coisas!, está pronto, Ele disse.


Como assim pronto?

Chegou o dia, seu trabalho está terminado.


Como que esperando o Mestre olhou fundo nos olhos dele e fez com a cabeça apontando para uma sala ali perto.


Estava um burburinho contrito na sala, todos ansiosos por orientação.

Como ele, cada um desempenhou sua função até ali e estavam aguardando o que viria acontecer.



Silêncio.


sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Das coisas que permanecem

Há tantas coisas temporárias, nesses nossos tempos.
Promoções, copos descartáveis, aparelhos odontológicos, serviço de motoboys, a nova novela das oito, orkut, relacionamentos, notícias, as bexigas do padre, as promessas de ano novo.

É só temporário, eles dizem.
Não precisa ser pra sempre.

E o que é que há de tão errado nesse tal de pra sempre?
Parece que o fato de ser temporário dá uma espécie de segurança, um alívio.
Tudo bem se não der certo, afinal é só temporário.

Ou vai dizer que não dá um gelo na barriga olhar na etiqueta um imponente "GARANTIA VITALÍCIA" ?

Poucos os loucos corajosos o suficiente para assegurar a garantia pela vida toda, porque afinal, vai saber quantos anos o sujeito ainda vai viver; o avanço da medicina, a preocupação com a sustentabilidade, comida sem agrotóxico, pilates, bla bla bla.

A efemeridade das coisas parece que tira um pouco da seriedade que vem junto daquilo que é vitalício, as coisas que duram.


Estava pensando sobre isso esses dias, quando da comemoração do último Natal.
Lá na casa da minha avó.
Quando a tradição da rotina e dos pensamentos dela parece que destoa das tantas coisas em mim que gritam do alto dos meus vinte e um anos "ei, dá uma licencinha que eu acabei de começar a viver!"

Na posição dos móveis, no conteúdo das gavetas, no esconderijo dos trocadinhos na cozinha, no barulho que ela faz quando anda com aqueles chinelos estalando na sola do pé na velocidade rápida e modesta que ela tem de ir da sala pra cozinha, da cozinha pro quarto, pra janela, pro telefone, pros vizinhos, no portão.

Nas flores do jardim, na oração que ela faz, tenho certeza que ainda, todos os dias de manhã por toda a família, no excesso de bolos e doces pras visitas, no jeitinho meio maroto de fazer comentários sobre as coisas pra dizer o que ela pensa sobre tudo.
Geniosa.
Certo, teimosa para alguns.

Ela que cultiva o hábito (talento, acho) de lembrar dos aniversários de todos os filhos netos bisnetos namorados agregados e casamentos. E ainda acha justo entregar no Natal um presente para cada um que ela mesmo fez, porque afinal é Natal não é, e o Natal é dessas coisas que permanecem.

Não sei o que é que a velhice traz mas acho que vai eliminando o temporário e enraizando na casa e nas linhas do rosto as coisas que permanecem, o que eu acho particularmente bonito.
(talvez seja por isso que eu ache tão horrível essas senhoras de mais de sessenta anos sem rugas, enchendo a cara de Botox. Com licença, por favor, gostaria de ver as marcas que esses teus anos deixaram, isso se deixaram.)

Mas por que é que não mudam esses móveis de lugar, não sei, vende a casa e compra um apartamentinho mais adaptado pra ela não ter que cansar tanto, nem sei se cansa, e aqueles chinelos que ficam estalando, e acho que ela não aguentaria sair daqui, já sabe onde ficam os talheres, o trocadinho, o armário dos copos, e acho que ela não sabe direito usar perfume aerosol, tirou a tampa e ficou sacudindo o vidro na palma da mão esperando as gotas cairem, e um dia desses eu reparei no barulho que faço usando havaianas e a forma que estalavam nos meus pés.

Acho que foi minha irmã que lembrou,
parece o barulho da casa dela.



Tudo bem, talvez a gente precise mesmo viver bastante pra descobrir o que é importante, acho que até gosto da leveza do que é temporário, e preciso saber que ainda dá pra errar bastante e começar tudo outra vez, se for o caso.

Mas não quero esquecer das coisas que permanecem.
As boas conversas, o Natal, as pessoas, Jesus, as rugas, as músicas, o céu.





E já que o ano começou hoje acho que desejo pra todos mais coisas importantes e bonitas, que encham a vida de sentimentos e pessoas,

que é pra chegar depois dos oitenta anos e achar legal passar o ano todo costurando o presente de Natal dos outros.



Feliz futuro para todos.
Ah, e pra não parecer que eu só quero dar uma de diferentinha o tempo todo,
Feliz 2010.